domingo, 9 de março de 2014

Reality show televisivo no Brasil: Serviço ou desserviço para a cultura brasileira?

Autor: Alexandre Flecha Campos é mestre em educação e especialista em docência universitária.
Após um longo período de regime de exceção, e com o advento da CF de 1988, a sociedade brasileira vem experimentando, mesmo que de forma lenta e gradativa, uma série de mudanças e conquistas no âmbito da convalidação de sua democracia, e, com esta, a possibilidade de rompimento de paradigmas e preconceitos, seja de maneira espontânea e informal, seja traduzida em mecanismos formais e regulamentadores como no caso de Leis, Diretrizes, Tratados, Portarias, etc, a reboque dos crônicos problemas de ordem cultural peculiares da sociedade brasileira...
No campo da educação, esta se apresenta eivada de deficiências de toda ordem, as quais são evidenciadas através de pesquisas estatísticas. Com o passar de décadas, a matéria tem apresentado tímidas melhorias, mas os resultados no ranking de avaliações internacionais são inexpressíveis se comparados dos da comunidade dos demais países do mundo.
Nesse sentido, o Brasil carrega uma triste dívida histórica e clama por um progresso no campo educacional tal, que seja capaz de promover o rompimento do gargalho, bem como possibilite gerar um avanço consistente na área, que reflita na qualidade de vida do povo brasileiro.
Vale ressaltar o grau de importância e contribuição que de fato se extrai na influência midiática, por via dos meios de comunicação, e como a televisão traz impactos positivos ou negativos quando se trata da inclusão da educação na sociedade brasileira que histórica e prioritariamente tem servido à seleta elite de uma classe dominante, formando um ciclo vicioso que acaba por favorecer a manutenção das enormes diferenças entre os níveis sociais.
Ações de fomento à educação e cultura de iniciativa da televisão brasileira como os telecursos, programas culturais e informativos, entre outros, possuem espaço muito restrito e ínfimo se comparado ao tempo destinado aos poderosos interesses comerciais expressos por campanhas de merchandising por parte de patrocinadores privados, além das propagandas de cunho político eleitoreiro por parte do governo e da classe política, de modo que a mídia brasileira tem deixado muito a desejar quanto à parcela de responsabilidade de contribuição social.
No que tange ao reality show no sistema televisivo no Brasil, programa originalmente surgido em país Europeu (produtora holandesa – Endemol, BBB), e posteriormente reproduzido pela rede Globo no formato do BBB (BIG Brother Brasil), pela emissora TV Record sob o título de A Fazenda, ou ainda pela TV SBT com a denominação de Casa dos Artistas, apresentam-se sob o “rótulo” de um jogo que dá a oportunidade "democrática" de participação de uma amostragem da sociedade brasileira, minuciosa e estrategicamente selecionada pelos bastidores das emissoras. Nesse aspecto, chama-nos a atenção algumas das repercussões desenhadas pela trama na formação intelectual e moral dos indivíduos participantes, algo que nos incita, portanto, a algumas reflexões no que diz respeito a traçar um paralelo entre a influência deste tipo de entretenimento e a ênfase cultural característica da sociedade brasileira.
Podemos citar, igualmente, alguns fenômenos intrínsecos ao cotidiano dos brasileiros, que dão um campo fértil e se aliam para o sucesso destas modalidades televisivas de reality show no Brasil: o consumismo desenfreado, o imediatismo, a busca da fama meteórica, a alienação, a possibilidade de se obter lucros milionários, o culto e vulgarização do sexo e a exposição de corpos sarados, o baixo nível cultural e educacional de grande parte dos telespectadores. Todos esses fatores parecem abrir um convite para a prática do prazer pelo puro prazer, admitindo que os fins justifiquem os meios. Simples assim.....!
Não há constatação de qualquer forma de benefício direto ou indireto para a educação e cultura brasileira proporcionado pelo reality show televisivo adotado no Brasil, não obstante o Código Brasileiro de Telecomunicação (CBT) dispõe que a televisão se propõe a atender a função educativa, cultural e informacional, e ainda estimular à prática esportiva, a música, a criatividade, sem deixar de lado a atuação no campo da reflexão sobre o valor, a ética, a moral e os bons costumes.
Ademais, prevê o CBT o limite máximo de 25% da grade de programação para veiculação de publicidade, o que é burlado pela estratégia de marketing do reality: Os “heróis” são usados para produzirem propaganda das empresas patrocinadoras por tempo integral via mensagens, sendo que estas muitas das vezes são repassadas de forma subliminar. Assim, lucros expressivos têm sido gerados em benefício das emissoras de televisão e seus aliados patrocinadores.
De acordo com a divulgação do site da UOL, somente o BBB atingiu a cifra aproximada de 500 milhões de reais a cada edição. Um bom lucro para tanta futilidade em tão pouco tempo, e em horário nobre da televisão, não acham...!?

Tomando partido da sociedade brasileira, veremos que o jogo televisivo de reality show resultante de um longo confinamento humano se consolida, em última instância, num entretenimento cujo legado é de alienação, futilidade, imaturidade, e, sobretudo, de omissão no cumprimento do papel social da TV aberta brasileira, agindo em desserviço da nação frente às enormes desigualdades sociais, representando uma verdadeira afronta à inteligência daqueles que almejam dias melhores para a educação e cultura deste país. Se liga Brasil........